23 de outubro de 2013

Astrologia

Descolei um trampo no jornal por esses dias. Não é nada demais, serei apenas o colunista que escreve o horóscopo diário, sabe como? Não me orgulho, não. Me formei em Jornalismo pensando que iria atrás de bandidos pra cobrir toda a matéria que iria ser veiculada no dia seguinte. É, as coisas não saíram como eu esperava. Acho que andei vendo muito CSI. 

O primeiro dia pode ser resumido em apenas uma palavra: tédio. Não que as pessoas não sejam legais por lá, elas até são. Mas, sério, escrever sobre os astros que regem sobre a Terra? O que tanto tem de interessante em ler meia dúzia de palavras dizendo que o seu dia vai ser uma maravilha (ou uma merda)? Não entendo... Mas ok, foi apenas o primeiro dia. Vai que as coisas mudam. Apesar de não ter tanta certeza disso.

Segundo dia: as coisas começaram a melhorar. Um pouco. Começaram a melhorar um pouco. Me mudaram de mesa. Agora sento ao lado de uma guria bem, como posso explicar, atraente. Minto! Ela é gostosa. Ponto. Gostosa pra caralho. Tenho até mais inspiração pra escrever a merda-da-minha-coluna-de-astrologia. Meu bem, não quer ser minha estrela guia não? Calma, não falei isso diretamente, mas sim no meu subconsciente. Um dia eu tomo coragem e falo tudo isso pra ela. 

No terceiro dia, apelei pro lado emocional da coisa: "Áries - Os astros estão alinhados com as estrelas, sua noite pode ser um tanto quanto diferente. Se atenha aos detalhes". Na hora ela me olhou. E me esbofeteou no rosto com uma fúria tão exagerada que eu juro que não entendi nada. Escrevi apenas o que os astros mandaram. Nada fora do normal. 

Quarto dia: chego na redação e não a encontro. Vai ver é o seu dia de folga, tudo bem. Ligo o computador e começo a redigir palavras sem sentido que não devem fazer sentido pra nenhuma pessoa. "Câncer - O amor está no ar. Se você já tiver um parceiro, espere uma surpresa por parte dele. Se não tem, tire o dia para conhecer novas pessoas. Nunca se sabe o que pode acontecer". Saco! Meu estoque de palavras está definhando. Cadê aquela garota?

No quinto dia, ela reaparece. De cara amarrada, não me dá nem bom dia. E eu, com esse meu jeito super galã-de-quinta-categoria, dou o meu melhor sorriso e... apenas desvio o olhar. Mas que porra! Nem pra dar bom dia eu presto. Os astros não estão ao meu favor. Ajuda aí, planetas e estrelas e sei lá mais o que

Sexto dia: sim, eu trabalho em pleno sábado. Pelo jeito as pessoas gostam de ler seus horóscopos todos os dias. Vou fazer o que? Trabalhar. A Amanda está de folga (de novo). É, er, eu descobri o nome dela. Não deu muito trabalho, só perguntei pro outro cara ali que senta do outro lado dela. E, ao mesmo tempo em que descubro como ela se chama, tenho que escutar um "cara, a Amanda tá tão fodida da cara com você". O que foi que fiz, meu Deus? 

Meu celular toca ao meio dia daquele dia insuportável. Era sábado, eu só queria pegar minhas coisas e sair dali. 

– Alô?
– Marcus! Você é um otário! Por que foi escrever aquelas coisas na quarta-feira? Eu fui obrigada a te dar uma na cara, você não presta mesmo!

Eu não estava entendendo nada.

– Desculpe, mas... quem é?
– Como assim quem é, seu insuportável? É a Amanda. Sabe, a tal gostosa que você tanto comenta com os outros.

Era blefe, só podia ser blefe. Eu nem falo com as pessoas que trabalham comigo. MEU DEUS!

– Acho que foi engano, vou desligar.
– Se você desligar, eu ligo de volta.

Ótimo. Desliguei. :)
Continuei a fazer as minhas coisas. Tinha mais meia hora de expediente. Ela não ligou mais. Melhor assim.

13h. Tchau redação, até segunda. 
Saio do prédio e vou até o bar da esquina. Ninguém é de ferro, vai. Peço uma cerveja. Bem gelada, por favor. Olho para o lado e... cacete!

– O que você está fazendo aqui?
– O mesmo que você, provavelmente.
– Qual é a sua, hein?
– Qual é a SUA, Marcus?
– Como você sabe meu nome?
– Isso não vem ao caso. Agora, me diz, o que foi que te deu pra fazer aquelas coisas na quarta-feira?
– Mas... o que? Porra, eu só estava fazendo o meu trabalho!
– Não, não estava. Você queria me atingir.
– Garota, você é maluca.

Bebo a cerveja toda em apenas um gole, bato forte o copo na mesa, deixo uma nota de cinco e saio porta afora.

– ESPERE!
– O que foi?
– Onde você vai?
– Pra casa?
– Não, não vai.
– QUÊ? É claro que eu vou. Não sou que nem você que tem folga aos sábados, sabia? Eu dou duro naquela redação, escrevendo sobre a porra dos astros que eu sequer acredito. E pra ganhar o que? Um tapa na cara da guria mais gostosa que já vi em toda a minha vida. Que, aliás, ninguém mais sabe que acho disso de você, ok? Eu mal falo com aquele pessoal que trabalha no jornal. Incluindo você. 

Amanda olha atônita pra mim. Não sabe o que falar. Dá meia volta e vai embora.

A garota tá na minha. Eu sei disso. 
Na quarta-feira, antes dela chegar, escrevi uma nota, a caneta mesmo, do lado da minha coluna em um dos jornais impressos e deixei sobre a mesa dela: "Você é muito bonita, minha estrela guia. Me liga." e deixei o meu número.

Como ela me achou naquele bar eu não sei.
Mas ela me ligou.
Valeu, astros!

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