19 de agosto de 2013

Anjo

Em uma noite qualquer pode acontecer muita coisa. Um exemplo? A história que vou contar agora.

Era julho de 1982. A rua estava deserta e a única companhia que tinha era a minha própria sombra projetada através dos postes de luz. Eu caminhava tranquilo e sem direção, a fim de descobrir um lugar ao qual eu pertencesse. Todo mundo quer pertencer a algum lugar e comigo não era diferente.

Já fazia alguns dias que não sabia mais o que fazer. Meus pais haviam morrido uma semana antes em um trágico acidente de carro. Eu estava perdido, não vou negar. Mas o que eu queria mesmo era acabar com aquela dor. Não gostava do fato de saber que, quando eu acordasse, não teria mais o sorriso de minha mãe para espantar meu mau humor matutino diário. E eu não gostava, também, do fato de ter que passar as próximas datas festivas sem escutar as piadas (sem graça, diga-se de passagem) do meu pai. É, a vida, às vezes, é estranha. E injusta.

Acostumei-me a fazer o mesmo trajeto todas as noites, sempre no mesmo horário. Sei onde é que estão os melhores bares da região, com as melhores formas de consolo que possam existir. Fora a cerveja, garotas fazem um bem danado à mim. Não sei bem por que, mas deve ser aquele jeito que só elas tem. Sabe, o de melhorar qualquer coisa. Com uma palavra, um carinho, um beijo ou... bom, uma trepada.

Certa noite conheci uma pequena. Mas não uma pequena qualquer, era a minha pequena. Ela tinha um jeito único de ser, sabia cuidar de mim como ninguém nunca soube. E eu... eu gostava disso. Sentia falta de ter alguém me esperando em casa depois de um dia cansativo que normalmente levava no jornal. E eu chegava, e ela me abraçava e me beijava e me amava. E ela me vivia, e eu a despia e a fazia minha.

E era dessa forma que a gente levava os nossos dias. Éramos leves, tranquilos, não tínhamos medo de qualquer coisa que estivesse por vir. Era eu por ela, ela por mim. Do começo até o final. Fizemos muitas coisas inimagináveis, coisas que, sinceramente, não preciso escrever aqui. Sabe como é, intimidades. Mas uma coisa eu posso afirmar à vocês, meus caros: eu não queria ela longe de mim de jeito algum. Ah, não mesmo.

Mas, em uma noite de lua cheia e alguns copos a mais no organismo, algo realmente impactante aconteceu. Nós estávamos voltando de uma festa. Aqueles tipos de festa que acontecem uma vez no ano e que não dá pra perder. Pois bem, daquele dia só me lembro de uma luz. E do baque. E, é claro, da sensação de perder mais uma pessoa.

Mais uma vez a vida foi injusta. Não por culpa dela. Muito menos por culpa minha. Ela simplesmente... foi. Conseguiu tirar de mim aquilo que mais me importava. Mas agora já não posso fazer muita coisa. Posso dizer que aqueles 36 meses que passei ao lado dela foram os melhores meses de toda a minha vida. Mas acabou.

E hoje eu sei que todas as noites ela reza por mim. E eu, todas as noites, olho por ela.

(...) Não importa pra onde olhar, sei que você vai estar aqui.

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